Reportagem de Arnaldo Galvão publicada no jornal Valor Econômico em 25/set/2007:
25/09/2007 às 11h37
CAE do Senado votará mudanças na Lei de Licitações
Por Valor Econômico
BRASÍLIA – Os senadores que integram a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) podem votar hoje o parecer sobre o polêmico projeto que muda a Lei de Licitações e obriga o uso dos pregões na escolha de fornecedores para obras de até R$ 3,4 milhões. A exigência seria válida nos casos onde o critério do menor preço é decisivo. O pregão é uma modalidade mais simplificada de licitação onde os fornecedores participam de um leilão às avessas, oferecendo lances sucessivos e menores.
Há muita resistência a essas mudanças. De um lado, o governo acredita que os pregões vão ampliar a concorrência e baixar preços. No projeto enviado pelo Executivo ao Congresso – integrou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) – essa modalidade de licitação estava prevista para as contratações de até R$ 51 milhões. Suplicy acabou acatando a redução do limite porque não havia consenso na CAE em torno da proposta do Executivo.
Mas do outro lado estão os que alertam para o aumento dos riscos para o poder público. Marçal Justen Filho, advogado, professor e especialista em licitações, prevê, apesar das boas intenções, ” resultados catastróficos ” . Ele explica seu temor argumentando que generalizar o uso dos pregões pode garantir preços menores, mas, por outro lado, se desprezaria a qualidade. ” O pregão é inviável para licitações mais complexas. Quem conhece o assunto sabe que vai ser um caos e a legislação terá de voltar aos padrões atuais. O pregão dificulta a verificação da capacidade do fornecedor e da qualidade do bem ou serviço oferecido ” , adverte.
Opinião diferente tem o secretário de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Rogério Santanna. Ele afirma que o texto enviado pelo governo foi ” aperfeiçoado ” no Congresso. Contestando os argumentos de Justen Filho, diz que a ampliação da concorrência é um grande avanço, o que garante preços menores nas licitações.
O secretário cita um estudo europeu que revela chances reduzidas de formação de cartel ou acordo entre concorrentes quando há mais de sete participantes nesses processos públicos de contratação. ” No âmbito federal, os pregões têm média de 12 participantes ” , informa.
As críticas à generalização dos pregões não são as únicas. O advogado afirma que o país perde uma grande oportunidade de aperfeiçoar as normas sobre contratos administrativos, no sentido de reduzir os privilégios estatais. Como exemplo, cita o direito de o poder público pagar em até 30 dias depois de receber o objeto licitado. ” Na prática, os empresários ficariam muito felizes se recebessem em 30 dias porque, infelizmente, o atraso nos pagamentos é muito maior ” , lamenta. Justen Filho conclui que esse privilégio do contratante acaba voltando-se contra ele quando os fornecedores elevam seus preços para compensar o risco que correm.
Santanna contesta essa crítica afirmando que o mercado sabe muito bem quem é mau pagador. Na opinião dele, a modalidade pregão é adequada para os processos onde prevalece o critério do menor preço. Prova disso, diz, é o fato de o Tribunal de Contas da União (TCU) utilizar largamente os pregões. Mas ele alerta que contrato prejudicial à administração pública é conseqüência da má qualidade do edital.
Pressionada por essas polêmicas, a CAE pode votar hoje o parecer do senador Eduardo Suplicy (PT-SP). Além da obrigatoriedade do pregão em contratos de até R$ 3,4 milhões, há a possibilidade da inversão de fases, quando as propostas de preços são reveladas antes da qualificação dos fornecedores.
Justen Filho critica o que chama de ” insistência ” na inversão de fases. Explica que a Lei 8.666/93 prevê, na modalidade pregão, a apresentação simultânea de dois envelopes. O primeiro a ser aberto é o que tem documentos sobre a capacidade do fornecedor. O outro apresenta a proposta econômico-financeira. Na sua avaliação, o que ocorre nas inversões é uma inclinação da administração pública em tolerar problemas sobre a capacidade do licitante quando a proposta comercial é atraente.
No projeto, a administração pública também poderia decidir quando as fases seriam invertidas. Mas o advogado argumenta que esse artifício deveria ser reservado a casos excepcionais. Ele alerta que é inviável aplicar esse mecanismo na contratação de obras e softwares, por exemplo. Justen Filho admite a inversão de fases nos pregões cujos objetos podem ser fornecidos sem verificar a qualificação do licitante. Cita o caso hipotético da compra de aviões. Como os poucos fabricantes em todo o mundo são grandes empresas de alta tecnologia e alcance global, o poder público poderia, em tese, abrir as propostas comerciais em primeiro lugar.
” A Lei de Licitações precisa ser aperfeiçoada, principalmente quando trata de obras e serviços de engenharia. Há muitas barreiras que impedem a participação de pequenas e médias empresas ” , reconhece o advogado.
O parecer de Suplicy também prevê um limite de 50% para o peso da técnica nos editais que exigem a composição entre técnica e preço. Outro ponto importante da proposta é a exigência de garantias quando o fornecedor reduz sensivelmente seu preço. Para evitar ” aventureiros ” ou ” inexperientes ” em licitações, seria exigida garantia nos casos onde o fornecedor aceita preço menor que 85% do valor previsto no edital. Essa garantia seria de 4% a 10% do valor do contrato.
(Arnaldo Galvão | Valor Econômico)
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