JOTA – A suspensão dos direitos políticos e o Ministério Público
Marçal Justen Filho – Coluna Publicistas
Carlos Ari comentou, em texto anterior, a decisão liminar do STF suspendendo a atribuição ao Ministério Público da legitimidade ativa exclusiva para a ação de improbidade. Faço considerações adicionais.
A previsão legal é constitucional. Inconstitucional era a solução anterior, que reconhecia legitimidade ativa também à entidade administrativa lesada.
A punição primordial por improbidade é a suspensão dos direitos políticos. A sanção reflete a repulsa a quem se prevaleceu da função pública para obter vantagens indevidas, lesar os cofres públicos ou infringir princípios administrativos essenciais.
Os danos sofridos não impõem a legitimidade ativa da Administração para a ação de improbidade. Na ação de improbidade, tal como se passa com os crimes contra a Administração Pública, incumbe ao Ministério Público exercer a pretensão punitiva no interesse da comunidade em geral. A sentença condenatória impõe punição ao infrator no interesse da sociedade, não para satisfazer interesse próprio e pessoal do autor da ação.
O interesse da pessoa estatal, vítima da improbidade, quanto à indenização pelos prejuízos (se houver) e à imposição da sanção administrativa pela infração pode ser satisfeito por vias específicas, no âmbito de processo administrativo ou por ação comum.
A Lei de Improbidade não eliminou a ação de indenização, que pode ser exercitada pela entidade vítima da improbidade. Aliás, a ação de improbidade não é a via mais simples e rápida para obter a recomposição dos prejuízos sofridos pela Administração. Afinal, numa ação comum, a condenação a indenizar os prejuízos sofridos pela Administração não depende da comprovação de dolo específico.
As práticas de corrupção, envolvendo pessoas jurídicas, são reprimidas no âmbito da Lei 12.846/2013, que consagra soluções muito mais severas do que as previstas na Lei de Improbidade.
É verdade que a ação de improbidade pode abranger a indenização pelos prejuízos e a perda da função pública, além de outras sanções. Mas essas não são as suas finalidades essenciais. São condenações de cunho acessório e complementar. A cumulação num único processo decorre da economia processual e visa à segurança jurídica. Aliás, assim também se passa no processo penal, em que a condenação torna certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime (CP, art. 91, I).
Não se pode admitir que a suspensão dos direitos políticos seja perseguida no contexto de interesses de diferentes agentes políticos. Uma das causas (ainda que não única) da banalização da ação de improbidade era a sua utilização como instrumento de disputas partidárias. A finalidade buscada, em muitos casos, era afastar o desafeto político. Isso servia, quando menos, ao discurso eleitoral e resultava em ações promovidas sem a presença dos pressupostos necessários.
Portanto, a previsão original do art. 17 da Lei de Improbidade é que padecia de defeito. A Lei 14.230/2021 corrigiu a falha. Tomara que o STF não restaure o equívoco.
Texto veiculado no JOTA, em 8.3.2022
Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/publicistas/suspensao-dos-direitos-politicos-e-o-ministerio-publico-08032022